Praça Frei Caetano Brandão


Há algum tempo já escrevi sobre a Praça Frei Caetano Brandão, mas sob a perspectiva deste sítio como foco da modernidade, expressa na experiência de Júlio Cezar Ribeiro de Souza e sua tentativa de colocar no ar seu "balão extravagante". Mas devia um outro texto, sobre o sítio em si. Este que publico abaixo já tem uns anos, mas falo das permanências deste espaço e me sinto obrigada a publicá-lo, antes que algum aventureiro lance mão da autoria...

"A atual Praça Frei Caetano Brandão pode ser considerada como pólo irradiador daquilo que, passados os séculos, podemos chamar de cidade de Belém. Surgida como variável dependente e contextual dos fatores históricos, sociais e políticos, o sítio que hoje, assim como no passado, chamamos de Largo da Sé foi o primeiro território, por assim dizer, conquistado pela cidade nascente fora dos muros do forte que lhe deu origem. Se considerarmos que a colonização portuguesa da Amazônia se fez a partir do primitivo Forte do Presépio, instalado em 12 de janeiro de 1616, temos o atual sítio como dos mais relevantes para a história urbana do norte do Brasil, como primeiro marco do que poderia ser chamado de cidade (do latim civitas = civilização).
Belém surge a despeito do paradigma genético das cidades, onde as funções econômicas e de fluxos se entrelaçam. A ideia de uma cidade aqui surge antes da estrutura para sua sobrevivência, visando ser, de fato, a porta de defesa e colonização da Amazônia. As trocas se estabelecem a partir do sistema simbólico dos poderes que se instalam: a Coroa, com a presença militar e administrativa, e a Igreja, expressa nas várias ordens que colonizam o território nascente com seus conventos e templos e, especialmente, com o embrião da Igreja Matriz: a capela de Nossa Senhora das Graças. O Largo reflete essas tensões.
A necessidade de expansão fez com que surgissem as primeiras ruas e, no seu correr, as primeiras casas. Como seria de se esperar, a tradição colonial portuguesa imperou na ordenação urbana da cidade de Belém em seus primeiros tempos. As ruas irregulares, seguindo a topografia da cidade, foram se desenvolvendo a partir do Forte do Castelo, já nos primeiros anos, ligando o largo a pontos importantes de definição da Cidade, como igrejas e outros prédios relevantes. Estas primeiras ruas surgiram paralelas à orla, referência geográfica, em direção ao interior, partindo do grande largo que surgia a frente da fortaleza, ladeada pelas igrejas, que tinha a função de praça d’armas à época. O casario que surge passa a ser conhecido como Feliz Lusitânia. A primeira rua assim definida, a Rua do Norte (atual Rua Siqueira Mendes) surge como via de acesso à morada do Capitão-Mor Bento Maciel parente, na atual Praça do Carmo, onde em 1626 já se instalara o convento carmelita. Outras vias seguiram o mesmo rumo, como a Rua do Espírito Santo (atual Rua Doutor Assis) e Rua dos Cavaleiros (atual Rua Doutor Malcher).
É na área correspondente ao antigo Largo da Sé é que os Jesuítas optam por erigir uma de suas mais representativas obras arquitetônicas no território da colônia portuguesa: A Igreja de São Francisco Xavier e o Colégio de Santo Alexandre, na transição entre os séculos XVII e XVIII. Foi em torno do largo que surgiram alguns dos referenciais arquitetônicos da cidade: a primeira edificação de dois pavimentos, construída nas imediações da antiga Capela de Santo Cristo, teve o início de sua construção datada da primeira metade do século XVIII, recebendo adaptações a partir de 1765, sob orientação de Giuseppe Antônio Landi. Conhecida hoje como Casa das Onze Janelas, foi erguida para residência de Domingos da Costa Bacelar e, nos idos coloniais, serviu de moradia aos governadores e capitães gerais do Grão Pará. Posteriormente abrigou o Antigo Hospital Real Militar, tendo sido ainda Quartel da 5ª Companhia de Guardas do Exército.
Ainda temos como testemunho alguns dos sobrados azulejados que resistiram à ação do tempo em perfeito estado de conservação. Assim como a sede do centenário Clube do Remo, que surgiu com suas regatas à beira da Baía do Guajará, mantém sua sede náutica na Praça Frei Caetano Brandão. Grandes empresas comerciais e empreendimentos industriais também se estabeleceram no entorno e se tornaram referenciais, como a loja Bechara Mattar, a Casa Círio, a fábrica da família Bittar, entre outras.
Nos últimos anos o entorno da Praça Frei Caetano Brandão vem sofrendo alterações que, se por um lado lhe garantem uma nova configuração paisagística, com a interligação da Praça com a orla do Rio Guamá/Baía do Guajará, também descaracterizam o aspecto do antigo Largo da Sé. O sítio hoje denominado Praça Frei Caetano Brandão já foi palco de muitos fatos memoráveis e dramáticos da história paraense.
O espaço que durante séculos, assim como a própria cidade, foi crescendo por conseqüência e se configurando em estratos de tempos, mantém em suas pedras a energia que as edificou. Assim como comporta muitas homenagens, tais como: O monumento erigido a Dom Frei Caetano Brandão é um dos mais importantes marcos do tempo na cidade de Belém. Através dele podemos ler, não só a obra do artista escultor e o momento histórico da homenagem, mas também a força do que representam.
Inaugurado em 15 de agosto de 1900, foi concebido pelo escultor italiano Domenico de Angelis, a partir de desenho de G. Tognetti, e executado por seu patrício Enrico Quattrini, sendo entregue à cidade pelo parceiro artístico Giovani Capranesi que concluiu a obra após falecimento de De Angelis. A Resolução nº. 54 de 1899, aprovada pelo Conselho Municipal, que autorizou o Intendente de Belém a mandar erigir o referido monumento em homenagem ao Frei Caetano Brandão (11/09/1740 – 15/12/1805), 4º Bispo do Pará.
Ele vem representado em trajes solenes de sua função episcopal no centro da Praça, adornado de mitra, báculo e capa magna, recamada de adornos em alto relevo. Encontra-se em pé, com o braço direito estendido em direção à Catedral, em atitude de quem abençoa seu rebanho. Porém ele se encontra em posição medianeira entre a casa episcopal, no antigo colégio jesuítico, e a Igreja Matriz; sua localização o coloca como que apresentando aquela que, mais que as funções eclesiásticas, foram a sua maior obra: a inauguração do Hospital da Santa Casa de Misericórdia, em 25 de julho de 1787, no edifício atualmente conhecido como Casa das Onze Janelas. Foi angariando esmolas para a construção de um hospital de atendimento à população desfavorecida, que fundou a Confraria da Caridade e o Hospital do Bom Jesus dos Pobres, que veio a dar origem à Santa Casa de Misericórdia. 
Ao inaugurar o monumento a Dom Frei Caetano Brandão, o então Intendente Antônio José de Lemos nomeia o antigo Largo da Sé como Praça Frei Caetano Brandão, fazendo, desta forma, a transição simbólica da velha Cidade colonial dos largos à moderna Belém do rico período da borracha, com suas belas praças e boulevares."

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