Por que regulamentar o Plano Diretor de Belém?

Um dos instrumentos não regulamentados no Plano Diretor Urbano de Belém é a Transferência do Direito de Construir. Este, juntamente com o IPTU Progressivo no Tempo, Outorga Onerosa entre outros podem (e devem) ser utilizados em grandes projetos de intervenção urbana, de forma que o cidadão não se sinta lesado no seu direito à cidade em detrimento de interesses particulares (mesmo que este "interesse particular" seja a visão de gestão municipal).
Mas como Belém só funciona à base de exemplo, eis um para que aprendam que legislação não é utopia. Copio e colo mensagem recebida pelo grupo do ICOMOS-Brasil:


"Preservar imóveis históricos pode ser lucrativo
Modalidade criada por construtora favorece a restauração de imóveis tombados em BH e movimenta mercado imobiliário na cidade


Humberto Siqueira - Estado de Minas

Publicação: 28/06/2012 13:06 Atualização:

Um segmento que já movimenta R$ 30 milhões em Belo Horizonte e que ajuda a conservar o patrimônio arquitetônico tombado da capital. Esse foi o propósito da criação da Unidade de Transferência do Direito de Construir (UTDC), uma moeda que pode ser gerada por imóveis tombados quando restaurados. São cerca de 700 deles na cidade.

Segundo o Conselho do Patrimônio Municipal de Belo Horizonte, cerca de 5% desses imóveis estão em péssimo estado de conservação, relegados pelos próprios proprietários, e, assim, ficam à mercê da invasão de moradores de rua e até de criminosos. Esse descaso ocorre pela falta de informação desses proprietários sobre a Lei de Transferência do Direito de Construir (Lei Municipal 7.165, de 27 de agosto de 1996).

Mas a lei só começou a pegar mesmo depois de 2003, quando os grandes terrenos em Belo Horizonte começaram a ficar mais escassos. O UTDC é uma moeda que permite ao construtor extrapolar o coeficiente de uso e ocupação do solo em até 20%, baseado no coeficiente disponível e não utilizado em imóveis tombados, que não podem ser demolidos, alterados ou descaracterizados.
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O cálculo é fácil: num imóvel tombado num terreno de 800 metros quadrados (m²), que tem uma casa de 300m² em zona com coeficiente 3.0, poderia ter uma área construída de 2,4 mil m². Como a casa tem 300m², ainda restariam 2,1 mil m². Essa sobra é transformada em moeda UTDC, que pode ser vendida pelo proprietário do imóvel.

Segundo o engenheiro civil e diretor executivo da Decisão Engenharia, especializada na comercializaçã o de UTDCs, Maurílio Duarte Câmara, "o regulamento consiste em beneficiar os proprietários de imóveis com restrições urbanísticas, que, quando tombados, sofrem com a desvalorização natural. Esses imóveis geralmente têm potencial construtivo transferível, que pode ser aproveitado por outros imóveis, que a lei chama de receptores. O cálculo dessa área resulta na moeda denominada UTDC", detalha. A lei, contudo, restringe-se aos imóveis tombados em bom estado de conservação.

CÍRCULO VIRTUOSO 

Ainda de acordo com o engenheiro, todos os envolvidos no processo são beneficiados. O dono do imóvel tombado, que tem o bem restaurado e valorizado; as construtoras e incorporadoras, que, com a compra, aumentam a capacidade construtiva de seus empreendimentos e o rendimento nos negócios; a prefeitura, que passa a arrecadar mais impostos com o aumento de área dos empreendimentos receptores; e a própria cidade de Belo Horizonte, pois, nesse processo, terá seu patrimônio preservado.

João Bosco Kuimara é proprietário de um imóvel tombado na esquina das ruas Espírito Santo e AImorés, no Bairro de Lourdes. "Considero-me um preservacionista. Comprei o imóvel já sabendo que era tombado. Só depois descobri essa legislação, que é de alta valia. O dinheiro arrecadado com o UTDC auxilia o proprietário na manutenção constante do imóvel", defende.

Alienação da UTDC

Depois da análise da solicitação e constatação de que o imóvel faz jus à Transferência do Direito de Construir, é emitida pela Prefeitura de Belo Horizonte a Certidão de Transferência do Direito de Construir - Imóvel Gerador, documento que certifica a área líquida possível de ser transferida. De posse dessa certidão, o proprietário do imóvel gerador providencia a averbação em cartório de imóveis e, a partir daí, pode alienar as UTDCs, total ou parcialmente, inclusive em momentos diferentes.

Moeda em alta 
Vendedor e comprador das UTDCs são beneficiados, já que o dono terá o imóvel valorizado e a empresa a capacidade construtiva aumentada

João Bosco Kuimara diz que o dinheiro arrecadado com a UTDC o auxilia na manutenção constante do bem 
Belo Horizonte conta com cerca de 700 imóveis tombados pelo patrimônio histórico, sejam residenciais ou comerciais, que contam com um mercado em ascensão para ajudar a preservá-los: a comercializaçã o de potencial construtivo transferível, por meio da moeda Unidade de Transferência do Direito de Construir (UTDC).

Desses 700, cerca de 500 realmente podem gerar a UTDC, cujo preço varia de R$ 400 a R$ 1,2 mil, de acordo com a região do imóvel gerador. Cabe à PBH dizer quantas UTDCs uma empresa vai precisar para extrapolar o potencial construtivo do terreno. Mas o preço do metro quadrado comprado por meio dessa moeda é mais baixo do que o metro quadrado do terreno. "A diferença de preço se deve também a algumas regras da PBH: um imóvel receptor na Zona Central de BH só pode comprar UTDCs provenientes do mesmo zoneamento ou da Zona Hipercentral" , exemplifica Márcia Junqueira, assessora técnica da Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana.

A fórmula para o cálculo de UTDCs leva em conta o preço do metro quadrado do terreno, de acordo com o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) e a área e o saldo da área líquida transferível. Os valores a serem recebidos pelo proprietário do imóvel gerador costumam ser altos. "Ter um imóvel tombado é um bom negócio", garante Maurílio Duarte Câmara, engenheiro civil e diretor executivo da Decisão Engenharia.

Atenta a essa demanda, a empresa especializou- se em restauração de imóveis tombados pelo patrimônio histórico e criou um banco para comercializaçã o de UTDCs. "Esse trabalho permite proporcionar um retorno significativo aos proprietários de imóveis tombados. Incentivamos esses proprietários a restaurar seu imóvel e, em alguns casos, utilizando recursos próprios da empresa, podendo restituir esses valores investidos por meio da comercializaçã o das UTDCs ou com elas próprias, desde que estejam disponibilizadas ao mercado por meio desse banco."

Atualmente, o banco conta com mais de 500 mil UTDCs. Em 2011, ano recorde para a empresa, foram negociados 60 mil moedas. "A procura tem aumentado bastante com a falta de terrenos maiores e a mudança na Lei de Uso e Ocupação do Solo. Deveria ser criada uma lei estadual parecida, pois tem muito imóvel histórico que poderia ser beneficiado com esse incentivo", completa Maurílio.

CONTROLE 

Para o diretor da Decisão Engenharia, Maurílio Duarte Câmara, ter um imóvel tombado é um bom negócio 
As UTDCs são geradas apenas uma vez e podem ser vendidas para diferentes receptores. Se uma pessoa tem 5 mil UTDCs e vende mil, vai receber uma segunda certidão depois da venda, com o devido abatimento. "A prefeitura tem todo o controle dessas moedas. Quando compra a moeda para um projeto, a construtora tem que nos apresentar essa certidão e o projeto é conferido para garantir que não extrapole mais de 20% do potencial construtivo do terreno", avisa Márcia Junqueira, assessora técnica da Secretaria Municipal Adjunta de Regulação Urbana.

José Eduardo Rubim de Moura, presidente do Centro Educacional Professor Estevão Pinto, negociou no ano passado as UTDCs relativas a um imóvel da instituição. O casarão, na Serra, pertenceu ao próprio Estevão Pinto e fica numa área de 4 mil metros quadrados. "O dinheiro veio em hora muito oportuna. Com ele pagamos pela restauração do imóvel e a maior parte ainda está guardada para uma emergência. Agora, pretendemos alugar o casarão. A verba ajudará na despesa da creche, que atende 600 crianças", pontua.

O processo para gerar as UTDCs junto à PBH levou dois anos, mas José Eduardo ficou satisfeito. "É uma forma de compensar o proprietário. O tombamento desvaloriza o imóvel em cerca de 25%."

Como funciona a comercializaçã o de UTDC

» Os donos dos imóveis tombados entram em contato com uma empresa ou profissional que tem o desejo de vender suas UTDCs;
» A empresa avalia a quantidade de UTDCs do imóvel disponível para venda, conforme a lei;
» Feita a avaliação, a empresa fecha contrato com o proprietário do imóvel tombado, abre o processo de Transferência do Direito de Construir e inicia a restauração para gerar o Potencial Construtivo Transferível, que será convertido em UTDCs;
» Construtoras, incorporadoras, engenheiros e arquitetos que querem aumentar o potencial construtivo do seu empreendimento compram UTDCs que sejam compatíveis com o terreno receptor."

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