Estão fatiando Belém na Câmara Municipal!

Recebi este texto por e-mail de uma pessoa que pediu anonimato. Como é um profissional que respeito muito, transcrevo integralmente:

"O mais novo bacharel e licenciado em Planejamento Urbano de Belém, o “nobre” Vereador Gervásio Morgado, tem apresentado sistematicamente vários projetos de lei para alteração da Lei nº 8.655/2008 que institui o Plano Diretor do Município de Belém – fato este comprovado por declarações proferidas em Audiência Pública realizada no dia 02.02.2012, pelo Presidente da Comissão de Obras e Urbanismo da CMB, Vereador Raul Batista, que assegurou existirem 16 projetos de lei de alteração do Plano Diretor na referida comissão. Os motivos para tais alterações são os mais variados, mas estranhamente inexistem justificativas técnicas, o que nos faz supor que só podem beneficiar o próprio ou grupos da iniciativa privada a ele relacionado; relações essas que todas as calçadas de Belém sabem, porém nunca provadas; inclusive com tentáculos em uma certa secretaria municipal, o que também se sabe mas nunca se comprovou...E assim, ganham-se, barganham-se, concedem-se direitos e a cidade sofre com o caos diariamente instalado.

Nesta nova bravata “a favor do desenvolvimento econômico de Belém com a geração de empregos na construção civil”, o citado vereador nos brinda com mais um projeto de lei alterando o Anexo IX do Plano Diretor - uma legislação novíssima, datada de 2008, com apenas 04 anos e revisão prevista a cada 10 – aditando um Modelo Urbanístico por ele criado sem nenhum critério técnico, ou por orientação de “alguém”, justamente na área de entorno do Centro Histórico de Belém – CHB (ALÔ órgãos de preservação e entidades de luta pela valorização do patrimônio histórico!!!), mas precisamente parte da Cidade Velha (na porção entre Av. Almte. Tamandaré e Rua Cesário Alvin com a Praça Amazonas), de Batista Campos, Nazaré e Reduto.

Trata-se do Modelo Urbanístico M27B a ser aplicado na ZAU 7 – Setor II no uso de Comércio Varejista. Este modelo irá permitir a instalação de empreendimentos cuja área do lote seja igual ou superior a 10.000m², tendo Coeficiente de Aproveitamento 3.0 e Gabarito de 40m, quando a legislação de preservação atual (ver Anexo IV da Lei nº 7.709/1994) permite apenas construções com 22m de altura máxima para esta zona.

Explicando: O empreendedor que possuir um terreno com área igual ou superior a 10.000m², ou comprar lotes menores com preços abaixo do mercado e remembrá-los em um único lote - prática comum do setor imobiliário – poderá aproveitar o coeficiente total quando da construção do empreendimento triplicando a área do lote, ou seja, em lotes de 12.000m² poderão surgir construções de até 36.000m², áreas com 20.000m² as construções poderão chegar a 60.000m², e assim progressivamente, sendo permitido que estas construções tenham até 40m de altura.

Ora, cabe-nos alguns questionamentos:
1. Qual o embasamento técnico que justifica, por meio de estudos e pesquisas, a adição do modelo proposto à zona em questão?
2. Qual o objetivo da proposta apresentada, em termos de incremento dos benefícios sociais e econômicos para a população?
3. Qual a viabilidade de instalação de empreendimentos deste porte na zona em questão, uma vez que, as vias de acesso hoje existentes na área apresentam sobrecarga no volume de tráfego?
4. Quais os impactos previstos na sobrecarga da infraestrutura urbana (coleta regular de resíduos sólidos, sistema de drenagem pluvial, esgotamento sanitário e de abastecimento d’água) quando da instalação de empreendimentos deste porte na ZAU 7 – Setor II e quais as alternativas apresentadas para a ampliação destes serviços, evitando o colapso dos mesmos na prestação dos serviços públicos à população?

5. Quais as medidas compensatórias ou mitigadoras que existem regulamentadas pela municipalidade que importem na contrapartida para instalação e ampliação de bens e serviços que incrementem a infraestrutura urbana quando da permissão de empreendimentos deste porte?
6. Quais os benefícios diretos e indiretos advindos com a instalação de empreendimentos deste porte na economia local, e como os mesmos podem ser revertidos em melhoria social à população usuária dos serviços, dos equipamentos públicos de uso comum e da infraestrutura urbana?

Não obstante, os empreendimentos a serem instalados quando da permissão de uso proposta pelo Projeto de Lei, são classificados pelo DENATRAN como Pólos Geradores de Tráfego, por se configurarem como de “grande porte” que atraem ou produzem grande número de viagens, causando reflexos negativos na circulação viária em seu entorno imediato e, em certos casos, comprometem a acessibilidade de toda a região, agravando as condições de segurança, trafegabilidade e mobilidade de veículos e pedestres, respectivamente.

Isto irá comprometer e inviabilizar totalmente as diretrizes propostas no Plano Diretor:

“...manter a ambiência e legibilidade no entorno imediato de imóveis, conjuntos ou quadras de interesse à preservação; melhorar as condições de mobilidade e acessibilidade na área; incentivar a manutenção de padrões morfológicos que assegurem a escala e proporção de conjuntos urbanos e edificações de interesse à preservação; controlar o processo de adensamento construtivo; controlar a implantação de empreendimentos potencialmente geradores de tráfego;...”



O projeto de lei é também falho se considerarmos o princípio constitucional da isonomia de direitos, pois trata-se de um caso de particularização de um território específico em detrimento de outras áreas da cidade que possuem as mesmas condições valho

Assim, antes de se apresentar projetos de lei para beneficiar uns poucos em detrimento de muitos e de todos, a CMB deveria cobrar e auxiliar o executivo municipal na regulamentação dos Planos Setoriais e dos Instrumentos Urbanísticos contidos no Plano Diretor do Município de Belém e não apenas “retalhar” uma legislação que tem por princípio:

“garantir a função social da propriedade urbana, onde o uso e a ocupação do solo deverão ser compatíveis com a oferta de infra-estrutura, saneamento e serviços públicos e comunitários, e levar em conta o respeito ao direito de vizinhança, a segurança do patrimônio público e privado, a preservação e recuperação do ambiente natural e construído”,


por meio da adoção de instrumentos urbanísticos que viabilizassem o desenvolvimento em padrões equânimes para todo o município, não só na zona em questão."


Para quem não sabe, estão fatiando e comendo Belém como se fosse uma grande pizza, nesta terra sem lei! A regulamentação dos instrumentos previstos no Estatuto das Cidades é uma necessidade, não é acessório.
Estou com tantas postagens inacabadas, pois cada dia é um absurdo que ocorre. Temos que nos posicionar coletivamente!

Comentários

Unknown disse…
Super legal o texto, mas como lutar contra isto e nos posicionar coletivamente contra este fatiamento se não conseguimos assumir o que pensamos, se não conseguimos sair do anonimato?
Gostaria de replicar o texto, mas sem citar a fonte é mais um grito perdido na internet.

Helga Roessing
Arquiteta
Claudia disse…
Helga, cite como fonte o blog.
Respeito o pedido de anonimato dos meus colaboradores eventuais, mas as análises feitas baseiam-se na legislação vigente. A única diferença é a precisão técnica nas questões que estão ocorrendo na cidade, a partir da Câmara Municipal de Belém.
Como lutar coletivamente? Existe uma "vigília cidadã" que tem acompanhado as sessões da CMB, especialmente às terças-feiras. Esteja lá.
Outra forma, que se associa com a anterior é a busca de informação: estamos no momento coletando assinaturas contra a mudança de modelo urbanístico no entorno do Centro Histórico.
Seja bem vinda e volte sempre.

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