Palacete Bricio da Costa

Amanda Pinto é o nome de uma das grandes promessas na área de patrimônio cultural em formação em Belém. Owner do blog C'on kiiid! é uma pessoa admirável, com excelente senso crítico e consistência. O seu trabalho de conclusão de curso foi objeto da matéria na coluna do professor Oswaldo Coimbra na edição de 11 de setembro no Diário do Pará. Como já nos conhecemos há algum tempo, me surgiram dúvidas que gostaria de esclarecer sobre o Castelinho (Palacete Bricio da Costa) e a matéria citada.

Como surgiu o seu interesse pela área de preservação do patrimônio?
Se me perguntarem porque eu escolhi o curso de arquitetura e urbanismo, provavelmente minha resposta (um "não sei" sincero) vai frustar o locutor, mas desde que entrei na faculdade já tinha em mente a especialidade em que queria trabalhar, que é a restauração de bens móveis e imóveis - principalmente porque eu tenho um fascínio por lustres. Então, quando você começa a estudar a história da as construções que compõem a evolução da cidade de Belém, e as observa em seu atual estado de conservação, percebe que urge a necessidade de olhar pra elas com atenção, até porque muito do patrimônio histórico paraense já foi perdido. Costumo pensar que a área de conservação e restauração do PH não é apenas uma segmentação da FAU e sim uma causa que só abraça quem realmente se preocupa. Questão de empatia.

Como surgiu o seu interesse pelo Castelinho?
Bem, essa não foi uma decisão instantânea. Para elaborar meu trabalho de conclusão de curso, primeiramente eu me interessei pelo prédio da União Beneficente dos Chauffeurs do Pará, até porque estávamos reunindo todos os arquivos pra montagem do dossiê de tombamento no DPHAC, pesquisei várias coisas do prédio, da dinâmica cultural do Teatro São Cristóvão quando a estrutura veio toda a baixo. Só sobrou a fachada. Desisti.
Então a minha orientadora, a prof. Thais Sanjad, me sugeriu uma residência eclética da Serzedêlo Corrêa, a n. 811 - onde eu também já havia feito vistoria pelo DPHAC - ou o Palacete Bibi Costa como objeto de estudo do TCC, ela me deu uma semana pra decididir mas na hora respondi que estudaria o Palacete.
Antes de entrar na faculdade estudava no Santa Catarina e quando voltava pra casa, sempre passava pela Joaquim Nabuco só pra admirar a construção, dizia que queria muito ter dinheiro pra comprar o castelinho pra morar nele quando ficasse grande. Soma-se a isso o fato de estar em uma área que sofre profunda verticalização e adquire nova função na cidade - de área residencial o bairro de Nazaré passou a ser área de comércio e serviços - e à condição de coadjuvante que o Palacete passou a desempenhar na paisagem urbana.
O dinheiro eu não tenho, mas me sinto realizada toda vez que visito o palacete pra levantar informações físico-cadastrais e sobre sua história.



"Cada casa é um caso", você sabe. O que você descobriu de interessante durante a pesquisa sobre o Castelinho?

A princípio todos pensam "Quem é esse Brício Costa?" Há pouquíssimas informações sobre o verdadeiro dono do palacete, mas Carlos Brício da Costa era major. O prédio, construído por Francisco Bolonha, foi originalmente projetado para receber o presidente da república Dr. Affonso Penna e sua comitiva, que no ano de 1906 fazia uma série de viagens pelo norte do Brasil a fim de conhecer as suas capitais, por isso a finalização e inauguração da obra iniciada em 1904, aconteceu em 21 de junho de 1906. Tudo girava em torno do conforto da estadia do presidente, por isso foi instalada uma estação provisória de bonde, e num terreno ao lado do palacete promoviam concertos comemorativos. A mobília e o sistema de iluminação do prédio eram os mais refinados, e o porão, além de cômodos para funcionários, contava com uma adega. Cada ambiente tem um desenho em mosaico de acapu e pau-amarelo, um trabalho no forro, as áreas molhadas e algumas soleiras são em peças importadas de ladrilho hidráulico, e sim, os lustres! As formas e materiais mais bonitos que eu já vi.
Mas com certeza o fato mais interessante, sem dúvida foi a descoberta de vitrais coloridos com desenhos florais que quase não se destacam na fachada da Joaquim Nabuco por estarem encobertos pela poeira.


Você avalia que a restauração do Castelinho é algo complicado? Que tipo de uso você proporia para lá?
É complicado se levarmos em conta o número de danos que o prédio tem sofrido, é impossível entrar em um ambiente e não diagnosticar pelo menos duas patologias (ou umidade, ou pequenas fissuras, ou caimento de piso, etc). É claro que para recuperar metade dos 56 cômodos que o prédio tem, de maneira adequada, i. e. sem ferir o partido original do mesmo e sem infringir nenhuma legislação de proteção ao bem tombado, não seria um orçamento relativamente barato. O uso que eu proporia era uma biblioteca, assim como o Museu da UFPA; o Palacete Costa é agradável, e ao contrário do que se instalou na mente dos populares, proporciona a tranquilidade necessária para propiciar o desenvolvimento de pesquisas literárias. Sem contar que aumentaria o interesse dos visitantes e pesquisadores em conhecer a real história do prédio e seus antigos moradores de maneira natural.

Nós que trabalhamos na área de preservação sabemos como é difícil a conservação dos imóveis antigos. Como está o Castelinho e qual a sua visão sobre o seu estado atual?
O Castelinho sofreu um incêndio em 2001 e grande parte do forro e das esquadrias internas da ala leste da fachada da Joaquim Nabuco, foi perdida. Muitos dos cristais que vedam as janelas já foram substituídos, sem o monograma CBC, algumas divisórias de compensado contemporâneas estão tomadas por xilófagos, e a cobertura em marselha e ardósia, também já foi alterada em grande parte. As fachadas e condutores de água pluvial sofrem com a umidade e a vegetação sobressalente. O estado de conservação dele é regular, mas se levarmos em conta o tempo em que ficou desocupado, comparando com outras construções desocupadas, percebemos que grande parte dos materiais originais se mantém quase intacta. Quer dizer, nenhum acréscimo volumétrico foi feito, e a única subtração drástica que foi executada, foi a da escada da torre, onde foi colocado um elevador, o que expõe o valor de uso que a edificação ainda tem.


Na sua opinião, de quem é a culpa da degradação dos imóveis: do poder público ou do proprietário? Ou dos dois? Qual a parcela de cada um?

A questão da degradação dos imóveis não pode ser entendida apenas sob essa ótica bilateral. Existe um série fatos que permeiam tal situação. É muito mais comum vermos, fazermos críticas incisivas sobre o poder público, já que assim se foi convencionado há muito tempo, e também pelo fato de o poder público realmente ter meios financeiros para promover o que seria a preservação de imóveis tombados, em área de entorno ou de interesse à preservação. Agora o que ninguém leva em conta é o real interesse do proprietário em manter determinado imóvel de pé, em condições favoráveis de preservação e que permitam a segurança de seu inquilino (em caso de aluguel) e/ou de vizinhos. O interesse pela preservação de bens históricos e culturais tem que partir desde a base escolar, o que não acontece aqui em Belém (e talvez por isso muito do nosso patrimônio já tenha se perdido), e o que impele a maioria das pessoas a se esquivar de suas responsabilidades para com ele.
Até pra se livrar desse tipo de responsabilidade, por puro comodismo de lutar. É muito mais válido criticar uma instituição que tem uma imagem solidificada há bastante tempo, do que descruzar os braços e tentar fazer alguma coisa pra manter ou salvaguardar um imóvel, que na verdade, a pessoa as vezes nem tem a estima para repará-lo.


Você já se mostrou uma excelente profissional quando atuamos juntas. O que você tira como exemplo ou experiência para o seu futuro, já que você está prestes a se formar?
Ainda falta muito para Belém se gabar de ter (e de fato cuidar bem de seu patrimônio histórico como um todo) em bom estado de conservação, a sua história arquitetônica, cultural, histórica, evolutiva. É de fundamental importância que órgãos como o Dphac, a Fumbel, o Iphan disseminem o verdadeiro propósito em se manter o PH belemense. O que a população precisa é de orientação, para entender o real valor de toda essa infinidade de leis de proteção aos bens, e eximir do pensamento a ideia fixa de que "casa velha é problema", porque só assim será possível despertar o interesse pelas nossas raízes. O incentivo à obras de restauração também deve ser uma prioridade do poder público, até porque sem passado, não é possível se construir o futuro.

Comentários

laísteixeira disse…
Olá, Cláudia!

Estou realizando um trabalho de pós-graduação sobre o palacete. Será que você ainda tem o contato da Amanda? Agradeceria bastante se você pudesse compartilhá-lo comigo =)

Laís Teixeira
Claudia disse…
Lais, eis: amandapinto003@hotmail.com
Carla Dias disse…
Lais, tens facebook? Gostaria de fazer contato contigo porque estou com um projeto que envolve o Bibi.

meu e-mail é carlabeatrizz@yahoo.com.br

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